Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida. João 5:24


quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Lições em Atos dos Apóstolos - Parte 2

Lucas, o médico amado e grande historiador da Igreja Primitiva

Não temos muitas informações acerca do autor de Atos dos Apóstolos. Sabemos apenas tratar-se de um homem singularmente culto e possuidor de um estilo literário de impressionante grandeza. Lendo-lhe o prólogo do terceiro evangelho, apreendemos de imediato a imparidade de seu engenho e a peregrinação de sua arte (Lc 1.1-4).

Pelo que depreendemos de suas obras, veio ele a converter-se depois da ascensão do Senhor Jesus. Mas, a partir da segunda viagem missionária de Paulo, ei-lo a participar ativamente da evangelização das gentes, pois destas era filho.

1) Um autor gentio a serviço do Rei dos judeus - Um artista da palavra que realçou a precisão. Basta ler a Epístola de Paulo aos Colossenses para se concluir ter sido Lucas um gentio de ascendência cultural grega (Cl 4.1-14). É possível fosse ele também cidadão romano.

Por conseguinte, Lucas é o único autor não hebreu das Sagradas Escrituras. Através de sua pena, sempre bela e terça, o Evangelho universaliza-se naquelas comunidades gregas, romanas e bárbaras que iam, pouco a pouco, sucumbindo à mensagem poderosa da cruz enunciada pelo apóstolo Paulo de Antioquia até Roma.

2) Um historiador que teologizou o avanço da Igreja - Quem não se encanta com os relatos de Heródoto? Filho do quinto século antes de Cristo, é ele alcunhado de o Pai da História. Pois fugindo ao mito e evitando os redimensionamentos de Homero e Hesíodo, buscou mostrar os gregos como estes realmente eram: seres humanos sujeitos às fraquezas, mas capazes de inacreditáveis façanhas. Apesar de todo o seu esforço, Heródoto não conseguiu evitar as hipérboles. Lucas, porém, lograria o que não alcançara o seu ilustre compatriota. Nos Atos dos Apóstolos, mostra o sobrenatural da operação do Espírito Santo na vida de homens naturalmente frágeis e limitados.

Fez Lucas, em seu evangelho, um relato fidedigno e metódico de “todas as coisas que Jesus começou a fazer e a ensinar até ao dia em que, depois de haver dado mandamentos por intermédio do Espírito Santo aos apóstolos que escolhera, foi elevado às alturas” (At 1.1-2). Já em Atos dos Apóstolos, pôs-se ele a narrar a expansão da Igreja de Cristo. Neste livro, a propósito, Lucas  participa não somente como autor, mas também como o personagem que, de forma modesta, oculta-se nas famosas seções do pronome da 1ª pessoa do plural (At 20.6, 8, 13,15; 21.16; 27.8 etc).

3) Um artista da palavra - Há historiadores que se contentam em reconstituir o passado, registrar o presente e futurar o porvir. Todavia, não se preocupam com o estilo. Poucos são os que, à semelhança de Alexandre Herculano, Oliveira Martins e Winston Churchill, fazem da historiografia uma obra de arte. Lucas pertencia a este seleto grupo. Tanto em seu evangelho como em Atos, vai ele não somente trabalhando, como também lapidando o texto. E de tal forma o lapida, que temos a impressão de estar diante de uma pedra de peregrino valor.

Em sua pena, o koinê ganha os mesmos contornos que a linguagem clássica cunhou na poesia de Homero, no teatro de Sófocles, na oratória de Demóstenes e nos diálogos de Platão. Lucas é um escritor por excelência. Mas não permitia que a beleza do texto empanasse a verdade dos fatos que, desde a ascensão de Nosso Senhor, se iam sucedendo na Igreja e através da Igreja, até a prisão de Paulo.

4) Um médico que compreendeu a verdadeira dimensão da fé - Lucas é o maior exemplo de que a verdadeira ciência pode conviver harmonicamente com a religião do Único e Verdadeiro Deus. Médico formado com todos os rigores acadêmicos da época, ele sabia como viver em harmonia com a natureza que nos deixou o Criador e não tinha dificuldade alguma em conviver com o sobrenatural e com os milagres que o Senhor opera no âmbito de sua obra. Se por um lado, deleitava-se em curar os enfermos que encontrava durante as incursões missionárias de que tomou parte; por outro, não lhe causava nenhuma estranheza quando Paulo impunha as mãos sobre os doentes e os curava das mais estranhas e malignas moléstias.

Nesse tempo, a medicina era bastante desenvolvida entre os gregos e os romanos. A escritora canadense Taylor Caldwell ao romancear a vida de Lucas, revela que os médicos formados nas academias gregas achavam-se habilitados, inclusive, a fazer operações plásticas. Aliás, no tempo dos macabeus, não eram poucos os israelitas que, na ânsia de se helenizarem, recorriam a procedimentos que lhes disfarçavam o sinal da circuncisão.

O ambiente que Lucas frequentou, antes de converter-se a Cristo, era academicamente sofisticado. A ciência ali era levada a sério. Sem eles, não teriam nossos cientistas alcançando tanto êxito. Entre os gigantes daquela época, achava-se o evangelista Lucas.

Lucas não era apenas médico. Conheciam-no todos como o médico amado (Cl 4.14). Seguindo certamente as recomendações de Hipócrates, o pai da medicina, tudo fazia para que os seus pacientes vissem-no também como um amigo. Num consultório do Rio de Janeiro, tive a impressão de que o Dr. Lucas lá estivesse. Pois um quadro trazia uma confissão simples, mas profundamente filosófica e ética: “Fui procurar um médico; achei um amigo. Eis aí o princípio de minha cura”. Como necessitamos de médicos que, à semelhança de Lucas, se dediquem aos doentes sem fazer das doenças uma fonte de renda.

Quando de meu transplante hepático, encontrei vários médicos e enfermeiros que procuravam, em suas limitações, imitar o médico amado. No Hospital Geral de Bonsucesso, no Rio de Janeiro, havia muitos discípulos de Lucas. E lá também estava o Médico que não somente nos emprestava a sua amizade, mas que nos garante a vida: Jesus Cristo, a quem Lucas anunciava quando exercia amorosamente a medicina.

Deveria Lucas, por conseguinte, ser o patrono não somente dos médicos, mas de todos os que se aplicam à ciência. Na prática, ele demonstrou que o cientista realmente sábio não encontra fronteiras entre a ciência e a religião; sua fronteira é o amor que consagra àquele que é a fonte de todo conhecimento e sabedoria.

5) Um missionário que não se limitou a escrever a história - Lucas é conhecido como médico e evangelista. No entanto, era ele também um missionário. Integrante da equipe de Paulo, andejou as vias romanas, singrou mares, enfrentou naufrágios. E em Roma prestou a necessária assistência ao apóstolo, a fim de que este não se visse de todo desamparado. Num momento de consolo, o doutor dos gentios mostra o quanto Lucas lhe é leal: “Somente Lucas está comigo” (2 Tm 4.11).

Não seria exagero se Lucas recebesse de igual modo o título de apóstolo, pois como apóstolo acompanhou Paulo em três de suas quatro viagens missionárias. Como apóstolo, escondeu-se ele na majestade da segunda pessoa do plural, a fim de singularizar o Senhor Jesus Cristo.

| Autor: Pr. Claudionor de Andrade

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