Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida. João 5:24


quarta-feira, 10 de abril de 2013

Quão horrível é o pecado (Paul Washer)

“Pois todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Rm 3.23)
 
A primeira coisa que Paulo diz é: “pois todos pecaram”. A palavra “pecado” significa, literalmente, “errar o alvo”. No caso do ser humano, nós não apenas erramos o centro do alvo, mas falhamos em acertar qualquer parte dele. Nós erramos o alvo por completo, quer seja em obedecer à lei de Deus, em permanecer na vontade de Deus ou em glorificar o nome de Deus. Ora, uma vez que somos nascidos de novo, ao ouvirmos “Todos pecaram!”, nós deveríamos cair de nossas cadeiras em adoração a Deus, agradecendo por tão grande salvação, pois Ele nos livrou de algo terrível! Porém, aqueles que tratam o evangelho como algo comum ou que criaram para si outro evangelho, deveriam prostrar suas faces em temor, sabendo que, se Deus não se mover em favor deles, eles estarão em pecado diante Daquele que é triplamente santo – e essa é a situação mais terrível que se pode imaginar.
 
Quando você ouve uma coisa repetidas vezes, geralmente ela se torna tão comum que perde seu poder. Eu me recordo da primeira vez em que eu cruzei a cordilheira dos Andes, junto com um grupo de missionários. Eu não conseguia entender porque o missionário veterano estava dormindo no meio de toda aquela beleza majestosa. Então, anos mais tarde, quando eu levei um grupo de jovens para atravessar a mesma montanha, eu me encontrei roncando. Com efeito, quanto mais você ouve algo e quanto mais você vê ou lê algo, esse algo perde um pouco de sua majestade.
 
“Todos pecaram”. Por que não trememos diante disso? É porque não sabemos como essa é uma realidade terrível. Nós não temos consciência do quanto temos pecado, do mesmo modo como um peixe não sabe o quanto está molhado. Nós nascemos no pecado, nós fomos concebidos no pecado, nós nascemos num mundo caído em pecado e a única coisa que nós conhecemos é o pecado. As Escrituras dizem que a nossa sociedade bebe iniquidade como se fosse água.
 
Além disso, nós também vivemos num mundo repleto de ignorância. Nós não temos conhecimento de Deus, não sabemos quem Deus é e O tratamos como se Ele fosse um tipo de Papai Noel ou como um vovô bobinho. Nós não entendemos que Ele é o Senhor dos senhores e o Rei dos reis.
 
Ao considerarmos o livro de Romanos, nós vemos o apóstolo Paulo nos apresentando a coisa mais próxima que temos de uma teologia sistemática. Ainda assim, ele toma os seus três primeiros capítulos e trabalha com toda a sua força tendo um único objetivo: fazer os homens desistirem de qualquer esperança carnal, fechá-los dentro de uma cova, trancar as portas, remover de suas mentes qualquer alívio na carne, a fim de que eles clamem a Deus por misericórdia. Quando nós vamos pregar o evangelho em um campo missionário, precisamos perceber que todo o nosso trabalho é uma absoluta catástrofe – e que experimentaremos fracasso atrás de fracasso, à parte do poder de Deus para ressuscitar homens mortos e odiadores de Deus. Nós precisamos, em nossa pregação, convencer os homens, através das Escrituras, com toda a nossa força, de que todos pecaram.
 
Muitos dos pregadores famosos atualmente estão ganhando tanta popularidade porque fazem de seu propósito não falar sobre o pecado. Porém, ao agirem dessa forma, eles vão contra a obra do nosso Senhor, que constantemente pregava sobre o pecado. Eles vão contra a obra dos apóstolos, que trabalharam com toda a sua força intelectual, movidos pelo Espírito Santo, para revelar o pecado do homem. E, principalmente, eu posso lhe assegurar que um pregador ou missionário que não valoriza o pecado não tem a obra do Espírito Santo em sua vida – porque uma das grandes tarefas do Espírito Santo é convencer os homens do pecado, da justiça e do juízo (Jo 16.8). Quando você não crê nisso, você está trabalhando contra o Espírito Santo.
 
Muitos questionam a Deus o porquê de o inferno ter duração infinita, se nós temos uma vida limitada de pecados. A principal razão disso é esta: cada pecado que você comete é cometido contra um Deus infinitamente digno e bom, logo, o seu pecado é de gravidade infinita. O problema é que nós nos esquecemos de que o pecado ainda é pecado! Veja a maneira como falamos sobre ofender ao Senhor: nós falamos de pecados contra os homens, de pecados contra nós mesmos, de pecado até mesmo contra a natureza, os animais e as árvores; entretanto, ninguém se dá conta de que todo pecado, no final das contas, é cometido contra Deus. Davi pecou contra seu povo ao não representá-lo bem como rei; Davi pecou contra Bate-Seba ao adulterar com ela; e Davi pecou contra Urias ao mandar matá-lo. Porém, no final, ele disse a Deus: “Pequei contra ti, contra ti somente” (Sl 51.4).
 
Por que o pecado é algo tão terrível? É porque ele é cometido contra Deus! Como podemos não tremer diante disso? É porque não compreendemos o que isso significa! E por que não compreendemos o que isso significa? É porque não sabemos quão glorioso e bendito Deus é! É uma coisa terrível quando percebemos contra Quem nós pecamos. Como os puritanos costumavam dizer, nós não pecamos contra um pequeno líder de uma simples cidade, mas contra o Rei da Glória, Aquele que está assentado no mais alto e sublime trono.
 
Imagine isto por um momento: Deus está no dia da criação, dizendo aos planetas que se coloquem em determinada órbita no espaço, e todos eles se curvam, dizem “Amém!” e Lhe obedecem. Ele diz às estrelas que ocupem seus lugares no céu e sigam à risca o Seu decreto, e elas todas se curvam e Lhe obedecem. Ele diz às montanhas que se ergam e aos vales que se afundem, e eles se curvam e O adoram. Ele diz ao bravo mar: “Você virá até este ponto e daqui não passará”, e o mar O adora. Porém, quando Deus lhe diz “Venha!”, você diz “Não!”.
 
Você percebe o quão perverso é o nosso pecado?

Extraído do livro O Verdadeiro Evangelho. © 2012 Editora Fiel.

domingo, 7 de abril de 2013

A Humanidade de Jesus…

 Seu nascimento (Lc 2: 6,7): Jesus não desceu dos céus, e sim nasceu de uma mulher humana, passando por todas as fases que uma criança normal passaria.
Sua árvore genealógica (Lc 3: 23-38; Mt 1:1-17): a Bíblia deixa evidente portanto que Jesus teve, por parte de Maria, ancestrais humanos, dos quais provavelmente herdou características genéticas, como todos os homens o recebem de seus antepassados.
Seu crescimento (Lc 2:52): cresceu como toda criança normal cresceria, alimentada por comida e água. Seu corpo não era sobre-humano, e não tinha características especiais, diferentes de qualquer ser humano normal.




 Suas limitações físicas: em tudo idênticas aos de um ser humano.

Sentia fome (Mt 4:2; Mc 11:12).
Sentia sede (Jo 19:28)
Ficava cansado (Jo 4:6)
Sofria a dor (Jo 18:22; 19: 2,3)


 Sua percepção pelos homens (I Jo 1:1; Mt 9: 20-22; 26:12; Jo 20: 25,27): Jesus de fato foi visto e tocado pelos homens a sua volta. Não era um espírito com a forma humana, nem um fantasma, mas um homem real, a ponto de Tomé só acreditar em sua ressurreição após tocá-lo. Mesmo o testemunho do Espírito de Deus afirma que Jesus tomou plenamente a forma humana (I Jo 4: 2,3a).
Sua morte(Lc 23: 46; Jo 19: 33,34): Jesus Podia morrer, como de fato morreu. Sua morte não foi aparente, mas verdadeira. Seu corpo sucumbiu aos sofrimentos infligidos e de fato expirou à semelhança de todos os homens. Esta é talvez a suprema identificação de Jesus com a humanidade, pois sendo Deus não deveria morrer, mas ao assumir plenamente a humanidade, torna-se sujeito a possibilidade da morte. Eis uma verdade tremenda e profunda.


“E o verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1:14)

 O tópico sobre a humanidade de Jesus não é tão discutido quanto a sua divindade, mas seu estudo é tão importante quanto este. Que Jesus é Deus, todos os cristãos sinceros concordam e entendem, contudo a idéia da sua humanidade, ainda que aceita, não é corretamente entendida, e poucas vezes ensinada.

O credo cristão formula a natureza de Jesus como sendo plenamente Deus e plenamente Homem. Ou seja, o Deus encarnado assumiu completamente a humanidade, tornando-se passível das mesmas limitações físicas e psicológicas comuns a todos os homens. Uma vez que estávamos separados de Deus pelo pecado, foi necessário que o próprio Deus encarnasse para que pudéssemos voltar a ter novamente comunhão com Ele. Dessa forma, a genuinidade da divindade de Cristo garante a eficácia de sua obra realizada na cruz, e a realidade de sua humanidade garante que sua morte é aplicável a todos os seres humanos.
Vejamos o que a Bíblia tem a nos ensinar sobre o aspecto humano da natureza de Cristo.


1. O Testemunho das Escrituras Sobre a Humanidade de Jesus

Há indicações claras na Bíblia que Jesus era uma pessoa plenamente humana, sujeito a todas as limitações comuns à raça humana, mas sem pecado. Como tal nasceu como todo ser humano nasce. Embora sua concepção tenha sido diferente, uma vez que não houve a participação de um ser humano masculino, todos os outros estágios de crescimento foram idênticos ao de qualquer ser humano normal, tanto física como intelectual e emocional. Também no sentido psicológico, era genuinamente humano, pois pensava, raciocinava, se emocionava, como todo ser humano normal.

1.1. Sua Natureza Física.
1.2. Sua Natureza Psicológica e Intelectual

Quanto ao Caráter Emotivo


 Sentia emoções (Mt 9:36; 14:14; 15:32; 20:34): ainda que sentir emoções não seja uma prova da humanidade de Jesus, uma vez que Deus também se emociona, elas demonstram a plena humanidade de Cristo, como também deixam claro algumas reações tipicamente humanas.
Sentia tristeza e angústia (Mt 26:37)
Sentia alegria (Jo 15:11; 17:13; Hb12:2)
Sentia indignação (Mc 3:5; 10:14)
Sentia ira (Mt 21: 12,13)
Se surpreende (Lc 7:9; Mc 6:6): Jesus se mostra genuinamente surpreso perante a fé do centurião e se admira da incredulidade dos habitantes de Nazaré. Não era uma atitude falsa ou de retórica, Jesus realmente era surpreendido em algumas circunstâncias.

 Se sente atormentado (Mc 14:33): no Getsêmani Jesus foi tomado de grande angústia e pavor. Estava em conflito íntimo e se atormenta pelo fato de não querer ser deixado só, contudo ainda assim escolhe fazer a vontade do Pai. Mesmo na cruz, sua frase “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Mc 15:34), é uma das expressões mais humanas de solidão já registradas na história dos homens.

Se comove e chora (Jo 11:33,35,38): Mesmo sabendo de antemão que Lázaro havia morrido, Jesus é tomado de comoção e chora ao ver a tristeza ao seu redor e a triste realidade humana da morte. A expressão “agitou-se no espírito”, retrata vividamente alguém gemendo no íntimo, aflito e comovido com uma situação que trás dor e cansaço.
Quanto ao Caráter Intelectual

Seu conhecimento era superior ao dos homens: em termos intelectuais, Jesus possuía um conhecimento que se destacava em relação aos outros homens. Ninguém na História Humana disse palavras tão belas, de grande profundidade e de maior alcance. Não só isso, Jesus deu claras demonstrações de um conhecimento além da capacidade humana. Sabia o que pensava os seus amigos e inimigos(Lc 6:8; 9:47). Conhecia coisas sobre o presente, pois sabia que Lázaro estava morto (11:14), o passado, uma vez que conhecia o fato da mulher samaritana ter tido cinco maridos (Jo 4:18) e o futuro das pessoas, ilustrado no fato de antemão ter avisado a Simão Pedro de sua negação (Lc 22:33).

Seu conhecimento não era ilimitado: em algumas passagens vemos Jesus fazendo perguntas retóricas afim de reforçar algum ensinamento (Mt 22: 41-45), contudo há outras passagens em que Jesus pergunta sinceramente em busca de informações às quais não possuía. Um exemplo claro foi o caso do garoto acometido de um espírito de surdez e mudez, onde Jesus pergunta ao pai dele “Há quanto tempo isto lhe sucede?” (Mt 9: 20,21). Há nesta passagem uma clara alusão que Jesus não tinha tal informação, e a julgava útil e necessária para promover a restauração daquele garoto. Um outro caso ainda mais explícito foi no discurso apocalíptico em Mc 13:32, quando ao ser interpelado sobre quando voltaria uma segunda vez, Jesus respondeu francamente: “Mas a respeito daquele dia ou da hora ninguém sabe; nem os anjos no céu, nem o Filho, senão o Pai”. Foi uma declaração clara de sua falta de conhecimento sobre essa informação. [Hélio discorda, ver CristologiaADoutrinaDeusFilho-CursoHelio.htm e Kenosis-EsvaziamentoDeCristoFp2-5-11-Helio.htm]
Quanto ao Caráter Religioso

Participava regularmente dos cultos na sinagoga (Lc 4:16): era de seu costume ensinar nas sinagogas e visitar e participar dos cultos no templo quando estava em Jerusalém. Humanamente mantinha um padrão de vida religioso irrepreensível quanto aos parâmetros de Deus.


 Mantinha uma vida de oração (Lc 6:12; 22: 41,42; Jo 6:15): várias ocasiões vemos Jesus sair para orar sozinho ou em grupo. Sua dependência humana do Pai era total e a oração era uma prova disso. Em todas as coisas Jesus se mostrou plenamente humano, tanto no aspecto físico, como no mental. Não havia dúvidas para os autores do NT que Jesus era plenamente homem.


 Que nossa salvação é sobrenatural (Jo 1:13): a salvação não vem pelo nosso esforço ou realização.


 Que a salvação é uma dádiva da Graça (Ef 2:8): assim como não houve nenhum mérito em Maria para que fosse escolhida, da mesma forma acontece conosco quando somos salvos.
- A esposa de Pilatos (Mt 27:19): “Não te envolvas com o sangue deste justo”.
- O ladrão na cruz (Lc 23:41): “este nenhum mal fez”.
- Judas, o traidor (Mt 27:4): “Pequei, traindo sangue inocente”.

2. Jesus, Plenamente Homem, Totalmente Singular

Pelos tópicos acima está claro que Jesus assumiu completamente a humanidade, sujeito a todos os reveses que o estado de humanidade poderia lhe trazer, contudo Jesus não um homem qualquer, igual a todos os homens.

Vários fatos em sua vida mostram essa santa singularidade:

2.1. O Nascimento Virginal

Jesus nasceu como todos os homens, no entanto sua concepção no ventre de Maria foi de origem divina, sem a participação do componente sexual masculino (Mt 1:18-25; Lc 1:26-38). Teologicamente chamamos a isso de concepção virginal. Maria era virgem na época da concepção e assim continuou até o momento do nascimento de Jesus. As Escrituras deixam muito claro que José não teve qualquer intercurso com Maria antes do nascimento de Jesus (Mt 1:25).


A influência sobrenatural do Espírito Santo é que tornou possível a geração de Jesus no ventre de Maria. Isso não significa que Jesus é o resultado de uma relação de Deus com Maria, longe de nós tal idéia. O que Deus fez foi providenciar, por uma criação especial, tanto o componente humano ordinariamente suprido pelo macho (e assim o nascimento ser virginal) como um fator divino ( e assim a encarnação).

Assim, o nascimento de Jesus nos aponta algumas verdades essenciais no cristianismo:

2.2. A Impecabilidade de Jesus

Outra prova da singularidade de Jesus como homem é o fato de não ter pecado: “…antes foi ele (Jesus) tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado.”(Hb 4:15)

A Bíblia mostra Jesus como um sumo sacerdote totalmente sem mancha e feito mais alto que os céus (Hb 7:26; 9:14). Pedro nos ensina que Jesus é o Santo de Deus (Jo 6:69) e que não cometeu pecado (II Pe 2:2). O que está de acordo com a afirmações de João, que em Jesus não existe pecado (I Jo 3:5), e as de Paulo que Cristo não conheceu pecado (II Co 5:21).
Mesmo as acusações de blasfêmia feitas a Jesus pelos judeus são infundadas (Lc 5:21), uma vez que Ele sendo Deus tinha pleno poder para perdoar os pecados. E mesmo algumas pessoas da época deixaram bem claro a inocência de Jesus:

A Bíblia deixa claro portanto a impecabilidade de Jesus, mas isso não invalida as tentações que sofreu como algo de somenos. Foram as tentações genuínas, e embora Jesus pudesse pecar, era certo que não pecaria. Entretanto alguém poderia levantar a questão: uma pessoa que não pode cair ao ser tentado, de fato experimentou a tentação? Um famoso comentarista bíblico, Leon Morris, argumenta que uma pessoa que resiste até o fim conhece todo o poder da tentação. Dessa forma a impecabilidade aponta para uma tentação muito mais intensa que estamos geralmente acostumados a pensar e sentir. Diz Morris que “O homem que cede a certa tentação não sente todo o seu poder”.

Uma outra pergunta que fica no ar é: se Jesus não pecou, Ele era realmente humano? Se respondermos não, estaremos incorrendo em gravíssima heresia, pois estamos dizendo em outras palavras que Deus criou o homem naturalmente pecador e portanto Ele é a causa do pecado e o criador de uma natureza má e corrompida. O Senhor é puro de olhos, Ele sequer pode contemplar o pecado (Hc 1:13), quanto mais ser a causa intencional de seres corrompidos pelo mesmo pecado. Não, a resposta não só não é este como a pergunta está formulada de maneira errada, pois estamos de certa forma perguntando se Jesus é tão humano quanto nós.

O correto é perguntar:
Somos tão humanos quanto Jesus? Esta pergunta nos remete a verdade que não temos a humanidade em toda a sua plenitude. Não somos seres humanos genuinamente puros, assim como Jesus o foi. Do ponto de vista bíblico só houve três seres humanos completamente humanos: Adão e Eva (antes da Queda), e Jesus. Todo o restante da humanidade é apenas uma sombra da humanidade original. Nossa humanidade é totalmente conspurcada pelo pecado que tenazmente nos assedia. Somos versões inferiores da versão adâmica original. Dessa maneira Jesus não só é humano como nós, como também é mais humano. É sua humanidade que deve ser padrão para nós e não o inverso.


2.3. A Unidade na Pessoa de Jesus

Jesus é também singular no que diz respeito a sua pessoa. Sendo Ele Deus perfeito e Homem perfeito, não é duas pessoas ao mesmo tempo. Ainda que seja de difícil compreensão a unificação do ser divino com o ser humano em um único ser, Jesus nos é apresentado dessa maneira nas páginas do NT.
A falta de referências bíblicas sobre uma dualidade existente na pessoa de Jesus já é claro indicativo que há uma unidade em torno de sua Pessoa. No entanto há textos claros sobre a deidade e a humanidade de Jesus reunidas em um único ser (Jo 1:14; Gl 4:4; I Tm 3:16; I Co 2:8).
A fé cristã enuncia este mistério desde o século cinco da seguinte forma:

“Um só e mesmo Cristo, Filho Senhor, Unigênito, que se deve confessar, em duas naturezas, inconfundíveis e imutáveis, indivisíveis e inseparáveis; a distinção de naturezas de modo algum é anulada pela união, mas pelo contrário, as propriedades de cada pessoa e natureza permanecem intactas concorrendo para formar uma só Pessoa…”


Jesus ao assumir a forma humana, adquire atributos humanos, mas não desiste de sua natureza divina (Fp 2: 6,7). Quando Paulo fala em Fp que Jesus se esvaziou assumindo a forma de servo, é da posição de igualdade com Deus que Jesus se esvazia e não da natureza divina. Assim Jesus se submete funcionalmente ao Pai e ao Espírito Santo no período da encarnação. Mantém todos os atributos divinos (Cl 2:9), mas os submete voluntária e humildemente ao Pai, não fazendo uso deles a não ser que seja esta a vontade dAquele que o enviou.
Também deve ficar claro que Jesus não era em algumas ocasiões humano e noutras divino, e nem mesmo um terceiro ser resultante da fusão das duas naturezas. Seus atos sempre foram humanos e divinos ao mesmo tempo. Dessa maneira a humanidade e a divindade são conhecidas de forma mais completa em Jesus Cristo. Não existe melhor fonte para conhecermos como deveria ser o ser humano do que olharmos para Jesus. Ele é o novo Adão e nEle somos feitos novas criaturas, segundo a vontade de Deus (Jo 1:12; II Co 5:17). Mas Cristo também é nossa melhor fonte para conhecermos como e quem é Deus, pois Ele nos revela de forma mais plena possível o Pai:

“Ninguém jamais viu a Deus; o Deus unigênito, que está no seio do Pai, é quem o revelou” (Jo 1:8).

“Se vós me tivésseis conhecido, conheceríes também a meu Pai. Desde agora o conheceis e o tendes visto. Replicou-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o Pai e isso nos basta. Disse-lhe Jesus: Filipe, há tanto tempo estou convosco, e não me tens conhecido? Quem me vê a mim, vê o Pai; como dizes tu: Mostra-nos o Pai?” (Jo 14: 8,90).

Jesus, Nosso Senhor, é alguém totalmente singular entre todas as pessoas que viveram e viverão na face da terra. Ele é o perfeito humano, sem pecado, dependente da vontade do Pai e submisso a ela. É também verdadeiro Deus, em honra, majestade e poder, que assumiu a humanidade e do homem teve compaixão a ponto de morrer por ele, de forma que este fosse liberto do pecado, para que pudesse viver como filho de Deus. Sua obra e propósito eterno foram e serão plenamente cumpridas. Louvado seja o Senhor por ter enviado seu Filho a mundo, para que fosse salvo todo aquele que nEle crê.
Ao Deus triúno na pessoa do Senhor Jesus seja a glória, a majestade e a honra, antes de todas as eras, e agora, e por todo os séculos. Amém!

sábado, 6 de abril de 2013

MIQUEIAS – A IMPORTÂNCIA DA OBEDIÊNCIA

 
Palavra do Senhor que veio a Miqueias, morastita, nos dias de Jotão, Acaz e Ezequias, reis de Judá, a qual ele viu sobre Samaria e Jerusalém (Mq 1.1)

Miqueias, assim como outros profetas já estudados, se enquadra no perfil daqueles que a sua origem humilde não impediu que fossem vocacionados por Deus para uma grande obra. O Senhor não faz acepção de pessoas.

 
Grandes profetas nem sempre surgem de grandes cidades, dos grandes centros religiosos, políticos, econômicos e sociais. Assim como Elias, o tisbita, e Jesus, o nazareno, Miqueias, o morastita, é portador de uma mensagem que veio da parte de Deus.
 

O livro de Miqueias é um chamado para se ouvir a voz do Senhor.
 

TODOS OS POVOS DEVEM OUVIR A VOZ DO SENHOR
 

Ouvi, todos os povos, presta atenção, ó terra, em tua plenitude, e seja o Senhor Jeová testemunha sobre vós, o Senhor, desde o templo da sua santidade. (1.2)
 

Os habitantes da terra, em toda a sua plenitude devem considerar, ouvir cuidadosamente, obedecer (hb. quasabh) a voz do Deus santo.
 

O juízo de Deus sobre a prevaricação (hb. pesa’, rebelião, transgressão) e o pecado (hb. hatta’ah, ofensa, iniquidade) de Samaria e Jerusalém é anunciado, e deve servir de alerta para todas as nações. O Senhor que edifica, é o mesmo Senhor que transforma tudo em um montão de pedras, ao ponto de expor os fundamentos (1.6). O pecado da idolatria (prostituição espiritual) é denunciado (1.7). Outros pecados são citados ao longo do livro, tais como a injustiça social, a violência, a mentira, a corrupção e a formalidade do culto.

 
Longe de ser insensível, um profeta de Deus não se alegra com os erros do seu povo, antes, chora e lamenta pela situação (1.8).
 

OS CHEFES (REIS, PRINCÍPES, SACERDOTES E PROFETAS) DEVEM OUVIR A VOZ DO SENHOR
 

Mais disse eu: Ouvi agora vós, chefes de Jacó, e vós, príncipes da casa de Israel: não é a voz que pertence saber o direito? (3.1)
 

Os chefes (hb. ro’s, governantes, líderes), que deveriam trabalhar para o bem do povo, maquinavam e praticavam o mal (2.1), cobiçavam os campos e as casas dos menos afortunados, e na condição de opressores e exploradores, tomavam dos mais pobres os seus bens e a sua herança, e isso usando de violência (2.2-3). Aqueles que deveriam ser promotores da justiça pervertiam o direito (3.1). A injustiça social era tanta que a metáfora utilizada para descrevê-la é muito forte:

 
A vós que aborreceis o bem e amais o mal, que arrancais a pele de cima deles e a sua carne de cima dos seus ossos, e que comeis a carne do meu povo, e lhes arrancais a pele, e lhes esmiuçais os ossos, e os repartis como para a panela e como carne do meio do caldeirão. (3.2-3)
 

Não muito diferente dos dias de Miqueias, boa parte da liderança política no Brasil vive da miséria alheia, e como recompensa são recebidos em nossas tribunas e púlpitos, e apoiados em períodos eletivos. O pior é que algumas lideranças evangélicas sabem da situação, mas se fazem de desinformadas. Quantos “fichas sujas” não foram apoiados por pastores na última eleição? Com quantos corruptos, ladrões e bandidos não foram feitos alianças e acertos imorais e ilegais?
 

Ouvi agora isto, vós, chefes da casa de Jacó, e vós maiorais da casa de Israel, que abominais o juízo e perverteis tudo que é direito, edificando Sião com sangue e a Jerusalém com injustiça. (3.9-10)
 

O grave nisso tudo é a conivência dos sacerdotes (autoridade religiosa), que deveriam confrontar o rei e os príncipes com a Lei do Senhor. As sentenças são dadas em troca de presentes, enquanto os ensinos dos sacerdotes buscam os seus interesses pessoais, ou seja, ensinavam por conveniência (3.11a). Não nos parece tal postura com a de alguns ensinadores e pregadores, que em busca de seus próprios interesses (agendas, ofertas, permanência no cargo, presentes, etc.) ensinam e pregam por conveniência?
 

E o que falar dos profetas? Deixemos que o próprio texto nos fale:
 

Não profetizeis; os que profetizam, não profetizem deste modo, que se não apartará a vergonha (2.6)
 

Se houver algum que siga o seu espírito de falsidade, mentindo e dizendo: Eu te profetizarei acerca do vinho e da bebida forte; será esse tal o profeta deste povo. (2.11)

[...] e os seus profetas adivinham por dinheiro, e ainda se encostam ao Senhor, dizendo: Não está o Senhor no meio de nós? Nenhum mal nos sobrevirá. (3.11b)

Mais uma vez a semelhança com os dias atuais é muito grande. O número de mercenários e mercadores da pregação e do ensino se multiplica na igreja. O pior é que tem quem pague pelos altos cachês dos “astros e estrelas da fé”. Pelos profissionais do púlpito.

Um pastor amigo meu, presidente de uma campo eclesiástico num dos estados do Brasil, me falou que um destes lhe procurou em seu gabinete, e lhe confessou que apesar de uma agenda muito concorrida, e de pregar em grandes eventos, na realidade não era crente de verdade. O pregador disse que tudo que fazia era mera repetição do que aprendeu observando. Quantos não existem na mesma condição? Há um livro que pretendo publicar no próximo ano, onde mais uma vez falarei da crise na pregação e no ensino dentro das igrejas evangélicas brasileiras.
 

Para os chefes de seu povo o Senhor diz:

Portanto, por causa de vós, Sião será lavrado como um campo, e Jerusalém se tornará em montões de pedra, e o monte desta casa, em lugares altos de um bosque. (3.12)

 
Os líderes podem cooperar para o crescimento e desenvolvimento de um povo, de uma nação, de uma igreja, ou para a destruição destes. Podem ser canais de bênçãos, ou podem atrair juízo.

 
Denunciar o pecado da liderança e de um povo nunca foi tarefa fácil. A liderança é detentora do poder de matar e deixar viver, incluir ou excluir, abrir portas ou fechar portas (isso tudo dentro de uma vontade permissiva de Deus). É por isso que Miqueias afirma:

Mas, decerto, eu sou cheio da força do Espírito do Senhor e cheio de juízo e de ânimo, para anunciar a Jacó a sua transgressão e a Israel o seu pecado. (3.8)

Somente cheio do Espírito é que um homem ou uma mulher de Deus pode convocar seus pares ao arrependimento e à conversão ao Senhor, e isso sem temer as consequências, sem se preocupar com o martírio.

CONCLUSÃO

 
Apesar dos juízos de Deus, o livro de Miqueias nos apresenta também uma mensagem de esperança e de restauração (2.12-13; 4.1-13; 5.2- 4, 9; 9.7-9).
Uma belíssima exortação encontra-se em Miqueias, que manifesta a vontade de Deus em nossa relação com o próximo e com Ele:
 

Ele te declarou ó homem o que é bom; e que é que o Senhor pede de ti, senão que pratiques a justiça, e ames a beneficência, e andes humildemente com o teu Deus? (6.8)
 

O livro termina com uma oração onde os atributos comunicáveis de Deus são destacados e exaltados:

 
Quem, ó Deus é semelhante a ti, que perdoas a iniquidade que te esqueces da rebelião do restante da tua herança? O Senhor não retém a sua ira para sempre, porque tem prazer na benignidade. Tornará a apiedar-se de nós, subjugará as nossas iniquidades e lançará todos os nossos pecados nas profundezas do mar. Darás a Jacó a fidelidade e a Abraão, a benignidade que juraste a nossos pais desde os dias antigos. (7.18-20)
 

Amém!

segunda-feira, 1 de abril de 2013

O uso dos Salmos na devoção cristã



Durante quase dois mil anos, os Salmos foram centrais para a devoção da igreja cristã, ensinando os fiéis a orar, em resposta ao Deus que se revela, uma confissão e glorificação ao Deus trino, criador, redentor e restaurador. Deste modo, “quando abraçamos Salmos, juntamo-nos a um amplo grupo de pessoas que por quase trinta séculos tem baseado seus louvores e orações nessas palavras antigas. Reis e camponeses, profetas e sacerdotes, apóstolos e mártires, monges e reformadores, executivos e donas de casa, professores e cantores populares – para todos esses e para uma multidão de outros, Salmos tem sido vida e respiração espiritual”.1 Como Eugene Peterson escreve, “não existe outro lugar em que se possa enxergar de forma tão detalhada e profunda a dimensão humana da história bíblica como nos Salmos. A pessoa em oração reagia à totalidade da presença de Deus, partindo da condição humana, concreta e detalhada”. Só que, por volta da primeira metade do século dezenove, com o aparecimento dos métodos críticos de estudos bíblicos, os salmos perderam sua centralidade na devoção cristã. Deixaram de ser a escola de oração que dava forma à oração dos fiéis, em sua resposta ao Deus que se revela. Passaram a ser vistos, na avaliação de Peterson, como a piedade deteriorada de uma religião desgastada.2



1. Os Salmos e a oraçãoA escola que Israel e a Igreja recorreram para aprender a orar foram os Salmos, que, junto com Isaías, foi o livro mais citado por Jesus e os apóstolos no Novo Testamento, inclusive como apoio de doutrinas centrais da fé cristã. Para os primeiros cristãos, a ordem era: “Enchei-vos do Espírito, falando entre vós com salmos” (Ef 5.18-19). Logo, estes, “como seus antepassados judeus, ouviram a palavra de Deus nesses hinos, queixas e instruções e fizeram deles o fundamento da vida e do culto”.3
Os salmos eram declarações de relacionamento entre o povo e seu Senhor. Pressupunham a aliança entre ambos e as implicações de provisão, proteção e preservação dessa aliança. Seus cânticos de adoração, confissões de pecado, protestos de inocência, queixas de sofrimento, pedidos de livramento, garantias de ser ouvido, petições antes das batalhas e ações de graças depois delas são, todas expressões do relacionamento ímpar que tinham com o único Deus verdadeiro. Temor e intimidade combinavam-se no entendimento que os israelitas tinham desse relacionamento. Eles temiam o poder e a glória de Deus, sua majestade e soberania. Ao mesmo tempo protestavam diante dele, discutindo suas decisões e pedindo sua intervenção. Eles o reverenciavam como Senhor e o reconheciam como Pai.4
Na igreja primitiva e durante a reforma protestante, quando um pastor queria ensinar sua congregação sobre a oração, pregava nos Salmos. Nos séculos IV e V, Atanásio de Alexandria enfatizou que cada Salmo “está composto e é proferido pelo Espírito”, sendo o “um espelho no qual se refletem as emoções” de nossa alma, onde “podemos captar os movimentos da nossa alma e nos faz dizer como provenientes de nós mesmos, como palavras nossas, para que, trazendo à memória nossas emoções passadas, reformemos a nossa vida espiritual”.5 Ambrósio de Milão, que introduziu o canto dos salmos no culto público no Ocidente, chamou-os de “um tipo de ginásio para ser usado por todas as almas, um estádio da virtude, onde diferentes exercícios são praticados, dentre os quais se podem escolher os mais adequados treinamentos para se alcançar a coroa”.6 Agostinho de Hipona, que pregou todo o livro dos Salmos para sua congregação, chamou-os de “escola”, “espelho” e “remédio”, “cantados no mundo inteiro”.7 Quando sua última doença o derrubou, ele pediu aos seus irmãos que fixassem nas paredes de sua cela cópias em letras grandes dos salmos penitenciais (Salmos 6, 32, 38, 51, 102, 130 e 143), para que ele os lesse continuamente.
No século XVI, Martinho Lutero afirmou que o livro dos Salmos “não coloca diante de nós somente a palavra dos santos, (...) mas também nos desvenda o seu coração e o tesouro íntimo de suas almas”, onde aprendemos a “falar com seriedade em meio a todos os tipos de vendavais”, e que o saltério “faz promessa tão clara acerca da morte e ressurreição de Cristo e prefigura o seu Reino, condição e essência de toda a cristandade – e isso de tal modo que bem poderia ser chamado de uma ‘pequena Bíblia’”. Ele também afirmou: “É muito benéfico ter palavras prescritas pelo Espírito Santo, que homens piedosos podem usar em suas aflições”.8 Em seu leito de morte, ele recitava continuamente: “Nas tuas mãos, entrego o meu espírito; tu me remiste, SENHOR, Deus da verdade” (Sl 31.5). Por seu lado, João Calvino, que comentou todo o livro de Salmos, escreveu:
Tenho por costume denominar este livro – e creio não de forma incorreta – de ‘Uma anatomia de todas as partes da alma’, pois não há sequer uma emoção da qual alguém porventura tenha participado que não esteja aí representada como num espelho. Ou melhor, o Espírito Santo, aqui, extirpa da vida todas as tristezas, as dores, os temores, as dúvidas, as expectativas, as preocupações, as perplexidades, enfim, todas as emoções perturbadas com que a mente humana se agita. (...) A genuína e fervorosa oração provém, antes de tudo, de um real senso de nossa necessidade, e, em seguida, da fé nas promessas de Deus. É através de uma atenta leitura dessas composições inspiradas que os homens serão mais eficazmente despertados para a consciência de suas enfermidades, e, ao mesmo tempo, instruídos a buscar o antídoto para sua cura. Numa palavra, tudo quanto nos serve de encorajamento, ao nos pormos a buscar a Deus em oração, nos é ensinado neste livro.9
No século XVII, o puritano Lewis Bayly, ao recomendar o cântico dos salmos pelas famílias cristãs, afirma: “Cantem para Deus com as próprias palavras de Deus”. E o uso do saltério deveria ter este alvo: “E faça uso frequente deles, para que as pessoas possam memorizá-los mais facilmente”. Então, ele oferece a sugestão do uso dos seguintes salmos para promover a piedade em família, nos momentos de oração e devoção:
De manhã, os Salmos 3, 5, 16, 22 e 144. De noite, os Salmos 4, 127 e 141. Implorando misericórdia depois de ter cometido pecado, os Salmos 51 e 103. Na doença em períodos de dura provação, os Salmos 6, 13, 88, 90, 91, 137 e 146. Quando o crente for restaurado, os Salmos 30 e 32. No dia de santo repouso semanal, os Salmos 19, 92 e 95. Em tempos de alegria, os Salmos 80, 98, 107, 136 e 145. Antes do sermão, os Salmos 1, 12, 147 e a primeira e a quinta partes do Salmo 119. Depois do sermão, qualquer Salmo relacionado com o principal argumento do sermão. Na Ceia do Senhor, os Salmos 22, 23, 103, 111 e 116. Para inspirar consolo e tranquilidade espiritual, os Salmos 15, 19, 25, 46, 67, 112 e 116. Depois do mal praticado e da vergonha recebida, os Salmos 42, 69, 70, 140 e 145.10
Desde o princípio, a Palavra de Deus sempre vem em primeiro lugar. Nós somos chamados a responder a Palavra de Deus, com todo nosso ser. E a oração é nossa resposta à revelação de Deus nas Escrituras. Sendo assim, os Salmos são a escola onde os cristãos aprendem a orar, pois como Peterson diz, “é esta fusão de Deus nos falar (Bíblia) e nós falarmos a ele (oração) que o Espírito Santo usa para formar a vida de Cristo em nós”.11 Ou, como Ambrósio escreveu, “a Ele falamos, quando oramos, a Ele ouvimos, quando lemos os divinos oráculos”.12 E Bonhoeffer completa: “Portanto, se a Bíblia também contém um livro de orações, isso nos ensina que a Palavra de Deus não engloba apenas a palavra que Deus dirige a nós. Inclui também a palavra que Deus quer ouvir de nós... (...) Que graça imensurável: Deus nos diz como podemos falar e ter comunhão com Ele! E nós podemos fazê-lo orando em nome de Jesus Cristo. Os Salmos nos foram dados para aprendermos a orar em nome de Jesus Cristo”.13
Se insistirmos em aprender a orar sozinhos, sem depender dos Salmos, nossas orações serão pobres, uma repetição de frases prontas: agradecemos as refeições, arrependemo-nos de alguns pecados, suplicamos bênçãos para nossas reuniões e até pedimos orientação. Por outro lado, toda nossa vida deve estar envolvida na oração. Peterson exemplifica esse fato com o livro do profeta Jonas, que gira inteiramente em torno das relações entre Deus e o profeta.14 Essas relações se originaram por meio do chamado profético, do qual Jonas procurou fugir. Mas este personagem não é entregue a si mesmo. Na primeira parte da historia, Deus deixa que o profeta chegue ao extremo de quase perder a própria vida, somente para em seguida restaurá-lo à posição onde se encontrava antes dele tentar evitar o chamado do Senhor.
No centro da narrativa bíblica está a oração que Jonas proferiu após ser engolido por um grande peixe. Sua primeira reação ao se encontrar no ventre do peixe foi fazer uma oração (cf. Jonas 2.2-9), o que não é surpreendente, pois geralmente oramos quando estamos em situações desesperadas. Mas existe algo surpreendente na oração de Jonas. Como Peterson destaca, sua oração não é original ou espontânea: “Jonas aprendeu a orar na escola, e orava como aprendera. Sua escola eram os Salmos”. Como o mesmo autor demonstra, frase após frase a oração de Jonas está repleta de citações dos Salmos:
  • “Minha angústia” de Salmos 18.6 e 120.1.
  • “Profundo” de Salmo 18.4-5.
  • “As tuas ondas e as tuas vagas passaram por cima de mim” de Salmo 42.7.
  • “De diante dos teus olhos” de Salmo 139.7.
  • “Teu santo templo” de Salmo 5.7.
  • “As águas me cercaram até à alma” de Salmo 69.2.
  • “Da sepultura da minha vida” de Salmo 30.3.
  • “Dentro de mim, desfalecia a minha alma” de Salmo 142.3.
  • “No teu santo templo” de Salmo 18.6.
  • “Ao Senhor pertence a salvação” de Salmo 3.8.
  • Cada palavra é derivada do livro dos Salmos. Geralmente achamos que a oração é genuína quando é espontânea, mas a oração de Jonas, numa condição extremamente difícil, é uma oração aprendida, sem originalidade alguma.
    Peterson prossegue: “Ter palavras prontas para a oração não é apenas uma questão de vocabulário. Nos últimos cem anos, teólogos deram atenção cuidadosa à forma particular que os salmos têm (crítica da forma) e os dividiram em duas grandes categorias: lamentações e ações de graças. As categorias correspondem às duas grandes condições em que nós nos encontramos: angústia e bem-estar”. De acordo com as circunstâncias e em como nos sentimos, lamentamos ou agradecemos.15 “Os salmos refletem muitas e diversas reações à vida: alegria, tristeza, gratidão e tranquila meditação, para nomear apenas algumas. O adorador israelita tinha uma oração pronta para todas as vicissitudes da vida. (...) Os salmos são orações cantadas para Deus, logo, eles chegam a nós como palavras da congregação dirigidas a Deus, em vez de a Palavra de Deus dirigida ao povo de Israel”.16
    Como Peterson enfatiza, “a forma mais comum da oração nos Salmos é o lamento”. Isso não deveria nos surpreender, já que essa é nossa condição mais comum. “Temos muitas dificuldades, então oramos muito em forma de lamento. Um estudioso da escola de oração dos Salmos conheceria essa forma melhor que todas, pelo simples fato da repetição”. Jonas se encontrava na pior situação imaginável. Seria natural que ele lamentasse. Mas ocorre o contrário – ele profere um salmo de louvor. Por isso Peterson escreve: “Uma lição importante surge aqui: Jonas estudou para aprender a orar, e aprendeu bem suas lições, mas ele não era um aluno que apenas decorava. Seus estudos não bloquearam sua criatividade. Ele era capaz de distinguir entre as formas e decidiu orar numa forma adequada às suas circunstâncias que ele enfrentava. As circunstâncias exigiam lamentos. Mas a oração, apesar de influenciada pelas circunstâncias, não é determinada por elas. Jonas usou a criatividade para orar e decidiu orar na forma de louvor”.
    Por isso, não é suficiente expressar nossos sentimentos na oração, como resposta a Deus: “Precisamos de um longo aprendizado de oração”. Por isso, a melhor escola para a oração é o livro dos Salmos. “Em sua oração”, Peterson continua, “Jonas demonstra ter sido um aluno aplicado na escola dos Salmos. Sua oração se origina de sua situação, mas não se reduz a ela. Sua oração o levou a um mundo muito maior que sua situação imediata”. Ele orou de maneira adequada à grandeza de Deus, que o chamara, nos oferecendo um forte contraste com a atual prática de oração. Nossa cultura nos apresenta formas de oração que são em grande parte centradas em nós mesmos. Mas a oração que é resposta ao Deus que se revela nas Escrituras é dominada pela percepção de Sua grandeza.
    2. A regra da oração
    Como Peterson enfatiza, o modelo básico de devoção é a oração diária baseada nos Salmos, sequencialmente, uma vez por mês.17 Mas precisamos destacar que a oração diária dos salmos não é uma ação isolada. Ela permanece entre outros dois fundamentos: a adoração junto com a igreja no domingo e a oração diária, que são recordações às vezes intencionais, outras vezes espontâneas, em resposta a Deus. Esses três fundamentos formam o ambiente de oração que estimulará a devoção. No diagrama sugerido por Peterson, esses fundamentos aparecem assim:

    A adoração na igreja firma nossa espiritualidade na Escritura e na vida em comunidade. Os Salmos nos levam a reaprender a linguagem da oração. E a oração recordada desdobra a oração para todos os pormenores da vida. O alvo é tornar a oração recordada incessante por meio da adoração comunitária junto com a oração dos salmos. Como Peterson escreve, “os Salmos, centrados entre Adoração e Recordação, são o lugar determinado onde habitualmente revisamos a base, o vocabulário e os ritmos da oração”. É esta dinâmica que desenvolverá nossa vida de oração. Por isso, a regra (regula) da devoção é: “Adoração Comunitária/Oração dos Salmos/Oração Recordada é a base de onde começamos e para onde voltamos – sempre”.
    3. Os cristãos e o uso dos SalmosComo aprendemos no Novo Testamento, Jesus Cristo, ao mesmo tempo em que orou os Salmos (Hb 2.12) é o principal tema dos Salmos. “O cristão encontra nos Salmos não somente os santos, mas também a Jesus Cristo, ‘o cabeça dos santos’, com seu sofrimento e sua ressurreição. Portanto, nos Salmos, como o Salmo 22 e 69, o próprio crucificado fala”.18 Portanto, é justamente aqui que é estabelecida nossa confiança de que seremos atendidos na oração: “Se permanecerdes em mim, e as minhas palavras permanecerem em vós, pedireis o que quiserdes, e vos será feito” (Jo 15.7). Pois como Bonhoeffer escreveu: “Ao repetir as próprias palavras de Deus, começamos a orar a Ele. Não oramos com a linguagem errada e confusa de nosso coração; mas pela palavra clara e pura que Deus falou a nós por meio de Jesus Cristo, devemos falar com Deus, e Ele nos ouvirá”.19 Jesus Cristo ensinou aos seus discípulos que os Salmos proclamam seu nascimento, vida, morte e ressurreição (Lc 24.44). Por outro lado, uma vez que o Filho é “Deus de Deus, Luz de Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro”, os Salmos são dirigidos a ele, assim como ao Pai e ao Espírito Santo (Jd 20-21). Portanto, Jesus Cristo é o alvo da oração dos salmos. E ao orarmos em nome e por meio da mediação de Jesus Cristo, nos unimos a ele, que vive sempre para interceder por nós (Hb 7.25).
    Portanto, Jesus Cristo é a chave que interpreta os Salmos e aquele que ora os Salmos deve buscar a Cristo como revelado no saltério. Em vez de tratar as promessas, súplicas, confissões e lamentos de forma analítica, na leitura dos Salmos aquele que ora participa das promessas, súplicas, confissões e lamentos do próprio Cristo. O foco de tal oração será, assim, alcançar uma maior comunhão com Jesus Cristo. “Lutero não sabia nada de um conhecimento da Bíblia puramente objetivo, desinteressado ou erudito. Tal conhecimento, mesmo se possível, seria apenas a letra morta que mata. O Espírito vivifica! Devemos, portanto, ‘sentir’ as palavras das Escrituras ‘no coração’. A experiência é necessária para entender a Palavra. Não é meramente para ser repetida ou conhecida, mas para ser vivida e sentida”.20 Num sermão sobre a expressão “invoquei o Senhor” (Sl 118.5), Lutero disse para congregação:
    Invocar é o que você precisa aprender. Você ouviu. Não fique aí apenas sentado ou virado de lado, levantando a cabeça e balançando-a, e roendo as suas unhas preocupado e buscando uma saída, com nada em sua mente a não ser como você se sente mal, como você está ferido, que coitado você é. Levante-se, seu tratante preguiçoso! Ajoelhe-se! Levante suas mãos e seus olhos para o céu! Use um salmo ou o pai-nosso a fim de clamar sua angústia ao Senhor.21
    As Escrituras, dessa forma, não são apenas a perfeita revelação de Deus, mas guia do cristão em suas lutas e vitórias – não apenas atos históricos passados e distantes, mas eventos vivos, aqui e agora. Deste modo, há outro fator que deve levar os cristãos a meditar e incluir os Salmos em sua oração:
    O abismo que há entre o cristianismo moderno e a espiritualidade da Bíblia pode ser visto (...) no nosso seletivo uso dos Salmos, que era o hinário do povo de Israel e da Igreja do Novo Testamento. Os Salmos não apenas refletem toda experiência humana (p. ex.: confusão, raiva, medo, ansiedade, depressão, alegria incontida), mas também nos forçam a parar de fingir que tudo esteja bem com o mundo. Os salmos de lamentação (por exemplo, os salmos 10, 13, 35 e 86) são veementes queixas diante de Deus em relação às contradições existentes entre suas promessas e a realidade pela qual o povo passa. Esses salmos raramente são usados no culto cristão hoje em dia. Contudo, esses salmos são atos de uma fé corajosa: corajosa, porque eles insistem em que temos que enfrentar o mundo como ele é, e que temos que abandonar toda ostentação infantil; mas também de fé, porque eles partem da convicção de que não existe assunto proibido, quando se trata de termos uma conversa com Deus. Reter daquela conversa com Deus qualquer coisa da experiência humana, inclusive a escuridão de uma oração não respondida e os aspectos negativos da vida, é negar a soberania de Deus sobre toda a vida. Assim, paradoxalmente, são aqueles que reprimem suas dúvidas com uma série de cânticos alegres que bem podem estar sendo incrédulos: pela recusa de crer que Deus pode cuidar de toda a raiva que eles têm. Assim, os salmos de protesto constituem uma poderosa repreensão ao que passa por fé e louvor na maioria dos grupos cristãos de hoje. O que é irônico é que a vida moderna talvez nos exponha a mais confusão e dor do que qualquer coisa do mundo do salmista; e contudo ignoramos exatamente aquelas orações que vêm de encontro a tal senso de desorientação. Não é de admirar que muito do ensino atual quanto à fé não seja diferente do ‘pensamento positivo’ dos gurus modernos da administração, conquanto vestido com uma roupagem pseudobíblica. A fé bíblica, entretanto, é exatamente o contrário.22
    Portanto, “os salmos continuam sendo um tesouro de auxílio espiritual para os cristãos. (...) Seja qual for o nosso estado de espírito, seja qual for nossa situação, as vozes antigas nos convidam a ouvi-las. Elas também já passaram por alegria, tristeza, luto, pecado, ira, confissão, perdão e outras experiências que tocam tão profundamente em nossas vidas. Elas nos chamam a aprender delas enquanto o Espírito Santo usa essas palavras para nos trazer para mais perto do Senhor”.23
    4. Colocando em prática
    Podemos nos beneficiar do que Dietrich Bonhoeffer escreveu sobre o uso dos Salmos: “Em muitas igrejas, cantam-se ou leem-se Salmos a cada domingo ou até diariamente. Essas igrejas preservaram uma riqueza imensurável, pois somente pelo uso diário penetraremos nesse livro divino de oração. Para o leitor ocasional, suas orações são pujantes demais em seus pensamentos e sua força, de modo que voltamos a procurar alimento mais digerível. Quem, no entanto, começou a orar o Saltério com seriedade e regularidade, logo dispensará as próprias orações superficiais e piedosas dizendo: ‘Elas não têm o sabor, a força, a paixão e o fogo que encontro no Saltério. São muito frias e rígidas’ (Lutero)”.24 Portanto, devemos incluir os Salmos em nossas orações diárias, permitindo que a Palavra de Deus estimule e guie nossas petições. E como uma ajuda para orar os Salmos diariamente em nossa meditação ou oração diária, oferecemos o roteiro abaixo:25

  • Dia 1: Salmos 1 a 8
  • Dia 2: Salmos 9 a 14
  • Dia 3: Salmos 15 a 18
  • Dia 4: Salmos 19 a 23
  • Dia 5: Salmos 24 a 29
  • Dia 6: Salmos 30 a 34
  • Dia 7: Salmos 35 a 37
  • Dia 8: Salmos 38 a 43
  • Dia 9: Salmos 44 a 49
  • Dia 10: Salmos 50 a 55
  • Dia 11: Salmos 56 a 61
  • Dia 12: Salmos 62 a 67
  • Dia 13: Salmos 68 a 70
  • Dia 14: Salmos 71 a 74
  • Dia 15: Salmos 75 a 78
  • Dia 16: Salmos 79 a 85
  • Dia 17: Salmos 86 a 89
  • Dia 18: Salmos 90 a 94
  • Dia 19: Salmos 95 a 101
  • Dia 20: Salmos 102 a 104
  • Dia 21: Salmos 105 e 106
  • Dia 22: Salmos 107 a 109
  • Dia 23: Salmos 110 a 115
  • Dia 24: Salmos 116 a 119.32
  • Dia 25: Salmo 119.33 a 119.104
  • Dia 26: Salmo 119.105 a 119.176
  • Dia 27: Salmos 120 a 131
  • Dia 28: Salmos 132 a 138
  • Dia 29: Salmos 139 a 143
  • Dia 30: Salmos 144 a 150
  • Pode ser de ajuda citar extratos de um ensaio sobre meditações diárias escritas por Eberhard Bethge em 1935, sob a supervisão de Bonhoeffer, para uso no seminário de pregadores (Predigerseminar) de Finkenwalde. Este oferece sugestões práticas que se aplicam ao uso dos Salmos em nossa oração e meditação diária:
    Nós recomendamos a meditação bíblica para moldar nossas orações e, ao mesmo tempo, para disciplinar nossos pensamentos. Finalmente, nós preferimos a meditação bíblica porque nos faz conscientes de nosso companheirismo com outros [irmãos] que estão meditando no mesmo texto. A Palavra da Escritura nunca deve parar de soar em nossos ouvidos, e [deve continuamente] trabalhar em nós ao longo do dia, como as palavras de alguém que você ama. E assim como você não analisa as palavras de alguém que você ama, mas aceita o que ele lhe diz, aceite a Palavra da Escritura e medita nela em seu coração, como Maria o fez. Isto é tudo. Isto é meditação. Não olhe para novas reflexões e conexões no texto, como se você estivesse preparando uma pregação. Não questione ‘como passar isto para alguém?’, mas ‘o que ele tem a dizer para mim?’ Pondere na Palavra longamente em seu coração e deixe que ela te dirija e te possua. Não é importante consumir o texto integral proposto para cada dia. Nós ficaremos, frequentemente, esperando um dia inteiro para ouvir o que ele tem a dizer. Deixe passagens incompreensíveis sossegadamente de lado, e não se apresse a ir à filologia. (…)
    Se os seus pensamentos o distraírem ore pelas pessoas e situações que lhe preocupam. Este é o lugar certo para intercessão. Neste caso, não ore em termos gerais, mas ore de forma objetiva por aquilo que lhe preocupa. Deixe a Palavra da Escritura o conduzir. Pode ser de ajuda você escrever calmamente o nome das pessoas com quem conversamos e pensamos todos os dias. A intercessão precisa de tempo se for levada a sério. Mas cuidado ao fixar um tempo designado para intercessão, para que esta não se torne uma fuga daquilo que é mais importante, a busca pela salvação de sua própria alma.
    Iniciamos a meditação com uma oração pelo Espírito Santo. Que ele clareie o nosso coração e prepare a nossa mente para a meditação e de todos aqueles que estarão meditando também. Então, nos voltamos ao texto. Ao término da meditação nós estaremos em posição de proferir uma oração de ação de graças com um coração satisfeito. (…)
    O tempo para a meditação é de manhã, antes de começar as tarefas. Meia hora é o mínimo de tempo necessário para a meditação. Observe que o pré-requisito é quietude extrema e o objetivo é não ser distraído por nada, por mais importante que seja.
    Uma atividade da comunidade cristã, infelizmente praticada muito raramente, mas bastante útil, é quando ocasionalmente duas ou mais pessoas se dispõe a meditar juntas. Mas que não tomem parte em discussões teológicas especulativas.26
    Bethge anexou esse texto a uma carta circular enviada de Finkenwalde para os pastores da Igreja Confessante (Bekennende Kirche), em 22 de maio de 1936. O ensaio foi rapidamente compartilhado entre os colegas pastores presos pelo governo nazista. Bethge contou depois em como a exigência de Bonhoeffer de que os alunos do seminário de pregadores de Zingst deveriam dedicar meia hora a cada manhã para meditação silenciosa de um texto bíblico lhes causou grandes dificuldades. Eles não sabiam como usar este tempo. Alguns iam dormir, outros preparavam sermões, outros nem sabiam o que fazer ou reclamavam que o tempo dedicado à meditação era excessivamente longo. Estas instruções tencionavam tornar claro aos seminaristas a importância da meditação e a maneira pela qual esta deveria ser feita.27
    Sandro Baggio, pastor-mentor do Projeto 242, preparou um roteiro para ajudar sua comunidade a praticar a leitura orante (lectio divina).28 Sugerimos que esse roteiro deve ser usado durante a meditação nos Salmos, na medida em que estas orações inspiradas pelo Espírito Santo são incorporadas às orações do povo de Deus:
    Lectio divina é um método de leitura-orante da Bíblia. É ler a Bíblia não tanto para acumular conhecimento, mas como uma forma de diálogo com Deus. Basicamente, a lectio divina consiste em statio (preparação), lectio (leitura), meditatio (meditação), oratio (oração), contemplatio (contemplação), discretio (discernimento), comunicatio (comunicação) e actio (ação). É preciso prática para penetrar na riqueza que a lectio divina pode trazer para sua vida espiritual. ‘Medita estas coisas e nelas sê diligente’ [1Tm 4.15]. A prática da lectio divina requer que você separe um tempo para estar a sós, num local tranquilo, sem distrações. Selecione o texto que deseja ler (de preferência, não muito longo).

    Os elementos centrais da lectio divina são:
    Ler: Atentamente, com prazer e com fome, saboreando as palavras como alimento espiritual. Leia o texto várias vezes, dando especial atenção aos versos ou palavras que lhe chamam atenção. Escute o que o texto fala com você.
    Pensar: O que esse texto significa para você? Que versos ou palavras falam mais à sua situação hoje? Como você tem vivido em relação a ele?
    Orar: Orar é responder ao chamado no profundo de seu coração para falar com Deus. Além de suas palavras, essa resposta pode ser também escrita em um diário espiritual, com gestos (ajoelhar-se) e cânticos.
    Viver: Você pode ler, pensar e orar o dia todo, mas a menos que você pratique a Palavra de Deus, não terá valido nada. É preciso colocar em prática o que Deus falou com você durante esse tempo de leitura e reflexão. Sua vida será o maior testemunho que você poderá dar.
    Nos dois textos citados acima é sugerida a meditação a sós. Mas queremos enfaticamente recomendar que o tempo de oração ao Deus Trino seja feita em comunidade – quando dois ou mais irmãos se reúnem para juntos buscar a Cristo em oração por meio da leitura dos Salmos. Pois não é natural que o cristão esteja só – a igreja, o ajuntamento dos fieis, é o corpo de Cristo, o templo de Deus, o santuário e habitação do Espírito Santo (1Co 3.16-17; 6.19; 10.16; 12.27; Ef 4.12) – e é em comunidade que o cristão irá não só aprender a orar, mas permanecerá em oração: “Regozijai-vos sempre. Orai sem cessar” (1Ts 5.16-17). 29
    Prossigamos com Bonhoffer: “Se em nossas igrejas já não oramos os Salmos, então devemos incluí-los com mais afinco em nossas meditações matutinas e vespertinas. Devemos ler vários Salmos diariamente e, de preferência, em conjunto, a fim de lermos este livro diversas vezes ao ano, penetrando nele com mais profundidade. Não deveríamos selecionar arbitrariamente alguns Salmos. Ao fazer isto, estamos desonrando o livro de orações da Bíblia, julgando saber melhor do que o próprio Deus o que devemos orar. Na igreja antiga não era incomum saber ‘o Davi todo’ de cor. Nas igrejas orientais isto era condição para o exercício eclesiástico. Jerônimo, um dos pais da igreja, conta que na sua época ouvia-se o cântico de Salmos nas lavouras e nos quintais. O Saltério marcava a vida da jovem cristandade. Mais importante do que isto, no entanto, é que Jesus Cristo morreu na cruz com a palavra dos Salmos em seus lábios. Ao esquecer-se do Saltério, a cristandade perde um tesouro inigualável. Ao recuperá-lo, será presenteada com forças jamais imaginadas”.30 Portanto, voltemos à beleza, riqueza, profundidade e amplitude dos Salmos como nosso guia da oração.

    Conclusão
    Durante sua longa trajetória, a igreja usou os Salmos para guiar a oração e a devoção. Então, por que tantas pessoas não se dedicam à oração? Porque, como nota Peterson, o poço é fundo e não temos nada para pegar a água. “Precisamos de um vaso para colocar a água. (…) Os salmos são esse vaso. Não são a oração em si, mas o vaso mais adequado (…) para a oração que já foi criado. Recusar-se a usar esse vaso de Salmos, depois de compreender sua função, é errar de propósito. Não é possível fazer um vaso de outro formato que o substitua”. Certamente já houve várias tentativas para substituir os Salmos como nosso guia da oração. Mas por que nos contentarmos com tão pouco, quando temos esse vaso maravilhoso à nossa disposição? Deste modo, que usemos os Salmos como o livro de orações da aliança. As palavras de Martinho Lutero são apropriadas como conclusão: “O nosso amado Senhor, que nos ensinou a orar o Saltério e o Pai Nosso e presenteou-nos com eles, conceda-nos, também, o Espírito da oração e da graça, para que oremos sem cessar, com disposição e seriedade de fé. Nós precisamos disso. Ele o ordenou e, portanto, o requer de nós. A ele sejam dados louvor, honra e gratidão. Amém”.

    Como comemorar a Páscoa do Senhor?

    Nós, os servos de Deus, fomos alcançados pela Sua misericórdia e libertos da escravidão do pecado. (“Mas damos graças a Deus porque vocês, que antes eram escravos do pecado, agora já obedecem de todo o coração às verdades que estão nos ensinamentos que receberam.” Rm 6:17) Vivemos nesta terra como retirantes estrangeiros, aguardando o momento de partimos em definitivo para a pátria celestial e estarmos eternamente com o Rei dos reis.
    Nesta jornada em direção aos céus é de suma importância manter-nos isentos das práticas e costumes comuns ao homem natural e firme na obediência à vontade de Deus; superando as muitas lutas, tentações e provações. O Senhor afirma: “... o mundo inteiro está debaixo do poder do diabo.”(1Jo 5.19) O diabo é o imperador deste mundo e dita as regras, os resultados comprava-se na falta de amor e nas barbaridades que os homens cometem entre si; nas loucuras praticadas contra Senhor; e na igreja que aos poucos vai assimilando e cristianizando práticas pagãs, é o inimigo minando as forças, afastando o homem do Senhor.

    A Páscoa é uma comemoração muito importante na vida do crente, ela é sinônima de libertação (Ex 12:17, 42; Dt 16.3) entende-se também como início de novos rumos, da nova caminhada em direção a uma vida santa e segundo o coração de Deus. Sua instituição foi ordenada por Deus (Ex 12.1,2 e Jo 2.23), a observação pelos filhos de Deus deve ser contínua (Ex 12.28,50), a exemplo do Senhor Jesus, que junto a seus discípulos a comeu (Mt 26,17-20).

    Usurpar-se da glória de Deus é a luta constante do diabo e, para tal, usa dos mais diversos meios. Em relação ao mover libertador de Deus (páscoa), o inimigo apresentou à igreja uma série de costumes e práticas pagãs, que imediatamente foram cristianizadas e incorporadas. Para comemorar a Páscoa, Coelhos e ovos de chocolate! Muitos desconhecem ou desconsideram a simbologia que os sustentam; são várias lendas, todas apontam para o fato de serem instituídos para louvor de determinada divindade; isto é o suficiente para que sejam eliminadas do arraial dos santos. O diabo chegou ao extremo de colocar um coelho (animal listado entre os impuros, lado a lado com os porcos e outros. Ver: Lv 11.6 e Dt 14.7,8), como representação do Senhor Jesus (o cordeiro). E todos concordam! É lamentável ver esta tradição extremamente viva no meio de muitas denominações.

    Igreja do Senhor Jesus Cristo é tempo de acordar para a voz do Espírito Santo e permitir a sua ação, limpando o acampamento, destruindo os “deuses do lar” (Is 31.7) e objetos amaldiçoados; para que haja paz no meio do arraial. Fechar as porta para o diabo e suas estratégia é uma ordem do Senhor Deus.

    Como comemorar a Páscoa do Senhor?

    “Este dia vos será por memorial, e o celebrareis como solenidade ao SENHOR; nas vossas gerações o celebrareis por estatuto perpétuo.” Ex 12.14

    A igreja na qual sirvo o Senhor, foi instruída por Ele a comer à páscoa nos termos descritos por Moisés em Êxodo 12. Amado, você que é um líder do Senhor nesta terra é tempo de tirar os fardos da sabedoria de sobre os ombros e colocar-se em exclusiva sintonia com o Espírito de Deus, ouvindo a Sua vontade, materializando-a. Prepare o cordeiro, assado com ervas amargas e reunidos na presença do Senhor, coma para a honra e glória de nosso Deus.

    “O cordeiro será sem defeito, macho de um ano; podereis tomar um cordeiro ou um cabrito... naquela noite, comerão a carne assada no fogo; com pães asmos e ervas amargas a comerão... Por sete dias, não se ache nenhum fermento nas vossas casas... Nenhuma coisa levedada comereis; em todas as vossas habitações, comereis pães asmos.” Ex 12.5,8,19 e 20

    E assim é feito em nosso meio. Um cordeiro é preparado, assado no fogo e comido com pães asmos e ervas. Oh graças! É a exteriorização de nossa alegria, de nosso amor pelo Senhor Jesus Cristo. Que nos amou primeiro e deu-Se em sacrifício por nós.

    Alguns aspectos que devem ser observados na celebração desta páscoa:

    a) Purificação:

    “Porque havia muitos na congregação que não se tinham santificado; pelo que os levitas estavam encarregados de imolar os cordeiros da Páscoa por todo aquele que não estava limpo, para o santificarem ao SENHOR.” 2Cr 30.17 (veja também: Jo 11.55):

    A santificação e purificação da vida é uma ordem, que deve ser observada por todos. Seja sacerdotes (pastores e autoridades da igreja) ou a congregação. Era preciso estar limpo para participar da celebração e comer do cordeiro pascal. O Impuro jamais participava da mesa. A preparação requerida era muito séria, incluía: orações, jejuns e outras formas de purificação. Santificação é uma palavra quase em desuso no meio cristão. Notadamente, a igreja tem andado de mãos dadas com o mundo, afinal tudo é natural e normal, costumes e práticas são adaptadas e inserida. Infelizmente, a Palavra de Deus é encaixada nas muitas doutrinas, moldada segundo o interesse de casa denominação. Quando, a ordem correta, seria, encaixar-se na Palavra santa.
     
    “Portanto, santificai-vos e sede santos, pois eu sou o SENHOR, vosso Deus.” Lv 20:7

    “Porque escrito está: Sede santos, porque eu sou santo.” 1Pd 1:16

    b) Excluíam o fermento:

    “...não comerás levedado; sete dias, nela, comerás pães asmos... Fermento não se achará contigo por sete dias, em todo o teu território...” Dt 16.3,4 (veja também: Ex 12.19,20)

    Nesta fase preparatória, de purificação, o fermento era totalmente excluído da alimentação, devido a sua significação (pecado). É perfeitamente válida esta palavra e na semana que antecede a esta tão importante celebração, todos os produtos que levam fermento em sua composição são excluídos da dieta diária. É provável que você questione tal posicionamento, talvez até evocando o fato de não mais estarmos sujeitos à lei. Não o julgo, de forma alguma. Eu aprendi do Senhor que a fé é primordial. Se você crer que Deus fala em tua igreja, não há porque questionar a vontade dEle. E assim tenho agido e nestas coisas, tenho visto o poder do Eterno.

    c) Ofertar:

    “Fala aos filhos de Israel e dize-lhes: Quando entrardes na terra, que vos dou, e segardes a sua messe, então, trareis um molho das primícias da vossa messe ao sacerdote.” Lv 23.10,14

    Quando os israelitas iam comer a páscoa, era costume trazer uma oferta ao Senhor, naquela época geralmente produtos da terra. Trazer oferta voluntária ao Senhor ainda precisa ser praticado. Mas, além da oferta material, seja você uma oferta viva ao Senhor, entregando-se como instrumento, santo, puro e cheio do Espírito Santo nas mãos do Senhor, para que Ele o use segundo o seu querer.

    O diabo ao longo dos séculos vem travando uma luta extremamente violenta contra o reino dos céus, faz uso de todas as suas armas para implantar o seu reino, e tem conseguido êxito. Em algumas oportunidades a sua forma de agir é explícita, todos olham e vêem; outras, as estratégias estão camufladas, e apenas os que “têm olhos” (espirituais) podem ver a ação devastadora do maligno. Em relação à páscoa a estratégia é camuflar o mal, desvirtuar o objetivo principal tomando para si a glória do Senhor Deus. Para alcançar este fim usa de meios “inofensivos” e com grande apelo visual e emocional (ovos e coelhos). Somente aqueles que tem os “olhos abertos” conseguem ficar isentos, não se deixam envolver pela artimanha maligna.

      Autora: Tia Stefanie